Segunda geração
O Ultra-Romantismo
Alguns anos depois da introdução do Romantismo no Brasil, a poesia ganha novos rumos com o aparecimento dos ultra-românticos. Esses poetas, desinteressados pela vida político-social, voltam-se para si mesmos, com uma atitude profundamente pessimista diante da vida. Vivem entediados, sem perspectivas, sonhando com amores impossíveis e esperando a morte chegar.
Os poetas da segunda geração do Romantismo, eram na sua maioria, jovens universitários do Rio de Janeiro e de São Paulo. Levavam uma vida desregrada, dividida entre os estudos acadêmicos, o ócio, os casos amorosos e a leitura de obras literárias européias. A maioria deles morreu com pouco mais de 20 anos de idade. Eles copiavam o estilo de vida dos escritores românticos europeus Byron e Musset, essa geração se caracterizava pelo espírito do "mal do século", quer dizer, por uma onda de pessimismo doentio diante do mundo, que se traduzia no apego a certos valores decadentes, tais como a bebida, o vício, e na atração pela noite e pela morte. No caso de Álvares de Azevedo, principal poeta do grupo, esses traços ainda são acrescidos de temas macabros e satânicos.
Subjetivismo, egocentrismo e sentimentalismo são traços marcantes na segunda geração.
O medo de amar: segundo Mário de Andrade, os ultra-românticos temem a realização amorosa. O ideal feminino é normalmente associado a figuras incorpóreas ou assexuadas, como anjo, criança, virgem..., as referências ao amor físico se dão apenas de modo indireto, sugestivo ou superficialmente.
Álvares de Azevedo
Álvares de Azevedo é a principal expressão da geração ultra-romântica de nossa poesia. O escritor cultivou a poesia, a prosa e o teatro. Toda sua produção - sete livros, discursos e cartas - foi escrita em apenas quatro anos, período em que era estudante universitário. Por isso, deixou uma obra de qualidade irregular.
As faces de Ariel e Caliban
A característica intrigante de sua obra reside na articulação consciente de um projeto literário baseado na contradição, talvez a contradição que ele próprio sentisse como adolescente. Essa contradição é visível nas partes que formam sua principal obra poética, Lira dos vinte anos. A primeira e a terceira partes mostram um Álvares de Azevedo adolescente, casto, sentimental e ingênuo. Ele mesmo chama a essas partes de a face de Ariel, isto é, a face do bem, do qual o poema seguinte é um exemplo:
Soneto
Pálida, à luz da lâmpada sombria,
Sobre o leito de flores reclinada,
Como a lua por noite embalsamada,
Entre as nuvens do amor ela dormia!
Era a virgem do mar! na escuma fria
Pela maré das águas embalada!
Era um anjo entre nuvens d'alvorada
Que em sonhos se banhava e se esquecia!
Era mais bela! o seio palpitando...
Negros olhos as pálpebras abrindo...
Formas nuas no leito resvalando...
Não te rias de mim, meu anjo lindo!
Por ti - as noites eu velei chorando,
Por ti - nos sonhos morrerei sorrindo!
Quando se abre a segunda parte da Lira dos vinte anos, contudo, o leitor depara com um segundo prefácio da obra, com os seguintes dizeres:
Cuidado, leitor, ao voltar esta página! Aqui dissipa-se o mundo visionário e platônico. Vamos entrar num mundo novo, terra fantástica, verdadeira ilha Baratária de D. quixote, onde Sancho é rei; [...]
Quase que depois de Ariel esbarramos em Caliban.
A razão é simples. É que a unidade deste livro e capítulo funda-se numa binomia. Duas almas que moram nas cavernas de um cérebro pouco mais ou menos de poeta escreveram este livro, verdadeira medalha de duas faces.
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Nos meus lábios onde suspirava a monodia amorosa, vem a sátira que morde.
Com esse comentário, o poeta introduz o leitor no mundo de Caliban, representado principalmente pelo poema "Idéias íntimas" e por uma série intitulada "Spleen e charutos". Embora não se inclua em Lira dos vintes anos, também se aproxima desse grupo de textos a obra de contos Noite na taverna e a peça teatral Macário. Esses escritos retratam um mundo decadente, povoado de viciados, bêbados e prostitutas, de andarilhos solitários, sem vínculos e sem destino. Observe essa atitude nestes versos de Álvares de Azevedo:
Vagabundo
Eu durmo e vivo ao sol como um cigano,
Fumando meu cigarro vaporoso;
Nas noites de verão namoro estrelas;
Sou pobre, sou mendigo e sou ditoso!
Ando roto, sem bolsos nem dinheiro;
Mas tenho na viola uma riqueza:
Canto à lua de noite serenatas,
E quem vive de amor não tem pobreza.
[...]
Tenho por palácio as longas ruas;
Passeio a gosto e durmo sem temores;
Quando bebo, sou rei como um poeta,
E o vinho faz sonhar com os amores.
A ironia é outro traço constante na obra poética de Álvares de Azevedo. É uma forma não passiva de ver a realidade, um modo de quebrar a noção de ordem e abalar as convenções do mundo burguês.
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